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Tron: O legado da busca pela perfeição

Em um mundo virtual, a busca constante pela perfeição do criador e seu clone acaba por ter um resultado inesperado que traz a reflexão sobre como lidamos com a perfeição no dia-a-dia, em nossos próprios mundos virtuais, as redes sociais.

Sam, filho do famoso programador de jogos de computador Kevin Flynn, sofre desde a sua infância pelo desaparecimento repentino de seu pai. Um sinal estranho leva Sam ao fliperama de Flynn, onde é puxado para dentro de um mundo cibernético, o mesmo em que seu pai criou e está preso há 20 anos.

Nesse mundo, o “Grid”, tudo era perfeito, ordenado e controlado. Onde Flynn, o seu criador, e CLU, um clone do alter-ego mais jovem do criador, eram os responsáveis por manter a ordem e o desenvolvimento desse novo mundo. Tudo ocorria bem até que o surgimento das ISOs (seres feitos de algoritmos extremamente avançado que surgiram do nada no Grid, sem terem sido programados) pôs em cheque o conceito de perfeição de Flynn. O Criador, que até então era fissurado em reformar tudo e desejava deixar tudo perfeito para os habitantes do Grid, passava a adotar uma visão mais pacifista, conformadora e reflexiva, algo que CLU (o retrato da versão jovem de Flynn) rejeitava a aceitar.

CLU e Flynn

Nessa sequência do clássico filme, TRON, é abordado diversos temas, desde a relação entre criador e criação até a capacidade humana de mudar as opiniões em relação a suas próprias crenças. Nessa postagem, trataremos sobre como a busca da perfeição retratada no filme pode ser trazida como reflexão para os dias atuais.

A Revolta de CLU

CLU, por ser um programa que representa o Flynn mais jovem, não possui a capacidade de se readaptar as mudanças que as ISOs trouxeram. Tal fato resulta na crescente repulsa do Alter ego do criador por tais seres. Para ele, as ISOs eram desorganizadas, imprevisíveis, incontroláveis, tudo aquilo que jamais se encaixaria na visão perfeccionista que era mantida pela sua própria programação.

A “imperfeição” das ISOs, somada a soberba e inveja desses seres dos quais o Criador dava grande atenção levou CLU a tomar para si o poder sobre o mundo. Dando início a um expurgo das ISOs e o estabelecimento de uma forma de poder semelhante a uma ditadura, onde os rebeldes são eliminados, ou são levados para uma arena de combate onde irão batalhar pelas suas vidas.

Para CLU, tudo tinha que ser certo, ordenado, previsível, controlado. Aquilo que não se encaixasse nesses parâmetros deveria ser reprogramado ou desintegrado. Tal perfeccionismo, por mais que seja exacerbado para fins poéticos, pode ser trazido para o contexto atual com a seguinte reflexão:

O Perfeccionismo de CLU pode estar presente no dia-a-dia?

Com a forte presença das redes sociais em nossas rotinas, é imprescindível afirmar que o crescimento do seu uso catalisado por um mundo pós pandemia (14,7% no Brasil em 2022, segundo a RD Station) pode trazer impactos nos valores que compõem o conceito de perfeição para os seus usuários, principalmente no quesito de beleza.

As mídias sociais podem reforçar o narcisismo e padrões de beleza, podendo impactar fortemente na imagem corporal de seus usuários. Além disso, ao se deparar com um ambiente onde o show do eu predomina, com diversos perfis mostrando o melhor lado do dia das pessoas juntamente com a ostentação exacerbada de conexões e bens materiais, a auto comparação pode levar o indivíduo a idealizar a perfeição que é observada da vida de terceiros.

Entretanto, há de se questionar essa perfeição retratada nas mídias sociais. A espetacularização da vida pessoal pode demonstrar apenas um lado teatral da vida, onde momentos ruins, seja nos relacionamentos, trabalho ou finanças do “protagonista”, são desconsiderados e até mesmo negligenciado pelo dono do perfil. Esse fenômeno se associa com o conceito de modernidade líquida de Zygmunt Bauman, onde a quantidade de likes, conexões e bens materiais são tidos como parâmetros da “perfeição”.

O Perigo da Perfeição

Na busca pelo sistema perfeito, CLU torna-se responsável por cometer o genocídio dos ISOs, seja através dos jogos na arena ou execução. CLU, ao “purificar” e trazer o estado perfeito ao GRID novamente, mirava um novo objetivo, o mundo exterior.

Diante uma crença de perfeição deturpada, a esse ponto CLU não só eliminou uma raça de seres como também traiu o seu próprio criador, caçando-o e eliminando quaisquer resistências que se mostrasse no caminho. CLU havia se tornado controlador, agressivo e arrogante, se tornara a sombra de Flynn.

O Longa Metragem mostra, de forma exagerada, os efeitos nocivos que essa busca pela perfeição idealizada pode provocar nas próprias pessoas e em terceiros. Trazendo pro contexto real, o Indicador de Confiança Digital(ICD) da Fundação Getúlio Vargas(FGV) mostra o impacto das redes sociais nos jovens brasileiros, apontando que 41% dos entrevistados obtiveram sintomas como tristeza, depressão ou ansiedade.

A imposição dos modelos líquidos de valores através das mídias sociais influenciam negativamente, em sua maioria, no bem-estar do indivíduo, seja por se menosprezar por não ter ou poder alcançar o que é tido como “vida perfeita” seja pela aversão ao estilo de vida proposto nas redes sociais.

Conclusão

Diante do pandemônio estabelecido no Grid por causa de CLU, Flynn durante o arco final do filme explica ao antagonista sobre o seu ponto de vista:

“O problema com a perfeição é que ela é irreconhecível.

Ela é impossível, mas ao mesmo tempo está à nossa frente o tempo todo.”

Flynn

Levando em consideração a afirmação de Flynn, será viável adotar uma postura estoica e crítica ao se construir uma visão acerca da perfeição? Ou mais vale evitarmos construírmos um senso de perfeição, justamente pela impossibilidade de se alcançá-la?

A perfeição é um conceito abstrato, utópico, criado pelo homem. Nem a própria natureza, por mais bela, funcional e suficiente que seja, é perfeita. Se repararmos na proporção áurea, tida como parâmetro da perfeição na beleza, percebemos que o número de Ouro não é um número exato, é um número quebrado…

Será que já não somos perfeitos? Se não, o que nos falta, o que falta em nossas vidas, trabalho, relacionamentos ou finanças? Até que ponto devemos buscá-la? É nosso propósito sermos perfeitos?

O Longa Metragem traz um senso conformador, onde a vida (representada poeticamente pelos ISOs) não é necessariamente perfeita apenas pela sua ordem, controle e previsibilidade mas também pelo caos, liberdade e imprevisibilidade.

Nessa busca por uma vida perfeita, talvez só precisemos perceber que ela já se encontra presente.

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